Paradoxo.

A minha foto
«(...) É por isso que eu não fico satisfeito em sentir o que eu sinto se o que eu sinto fica só no meu peito.»

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Ela sabe que não consegue precisar o momento, a hora, o dia em que uma pessoa fica apaixonada. Sempre um pouco antes, sempre um pouco depois. Ela sabe que não se pode revelar definitivamente como, e porquê, uma pessoa ficou apaixonada por esta pessoa, precisamente esta, e não por outra parecida com ela. Qualquer razão perder a razão. O que uma pessoa pode sentir é se esta ou não apaixonada. Que houve um estreito abismo, sem saber quando nem como, sobre o qual sabe que saltou. Sem poder avaliar as consequências. Como uma doença. Não é só isso. Uma pessoa quando está apaixonada não está continuamente apaixonada, muito menos com a mesma intensidade. Varia muito. Acontece uma pessoa duvidar se está ou não apaixonada. Ficar totalmente baralhada. É mais fácil uma pessoa sentir paixão por outra quando ela não está presente. Isso parece-lhe um facto. A sua ausência aumenta o poder da sua presença. A paixão é mais sua, mais inteira, há menos interferências. Com ela é assim. Sente um vazio que só o outro, único no mundo todo, vai poder preencher, sarar, curar. Uma espécie de saudade imperiosa. Uma questão de vida ou de morte. (Tem ainda outros problemas.)
A amizade, a paixão, o amor, o ódio. Sobretudo é muito difícil para ela distinguir a paixão do amor. O que será o amor sem paixão? Ela não sabe sequer se isso existe.
Ela estará mesmo apaixonada pelo «professor» ou precisará tanto dele para se julgar protegida de si própria? Ela não sabe. Sabe que nunca saberá. Nunca soube. Ela sabe que não deve pensar demasiado. Arrisca-se a entrar numa zona de confusão da qual já não se consegue livrar.

Não. Ela está apaixonada. Provas? Pensa nele varias vezes por dia sem que venha a propósito. Atrapalhando o que está a fazer. Quando no metro há uma paragem inesperada e o silencio e a ansiedade aumentam de volume ela teme começar a gritar o nome dele. Quando está a nadar. Aí pode ficar muito tempo a pensar nele. Mais provas? Telefona-lhe sem ter nada para dizer. Só para ouvir a voz. Ter a certeza que aquela voz existe. Mais grave. Diante do espelho da casa de banho sente que é dele. Pelo menos alguma coisa de muito importante em si já não pertence a ela, mas sim a ele. Sem duvida o mais intrigante. Uma pessoa oferecer uma parte de si a outra pessoa. Querer pertencer-lhe. Poder receber em si a outra pessoa. Estar preparada. Mas o mais importante é confiar que através dele, com ele, ela será mais ela, descobrirá por fim quem é.
Começou a ler um livro que era dele. Sem pedir autorização. Uma breve história da fotografia.

Ninguém é dono das palavras que se lêem ou se dizem. As minhas palavras não são minhas. Nenhuma palavra. Passam por mim. Vêm de muito longe, hão-de ir para muito longe. Não se sabe onde. Cada uma com uma historia tão complexa que ninguém pode escrever. Miguem deve poder ou vender uma palavra. Uma marca é uma palavra prostituída.

Não se deve pretender conhecer tudo o que diz respeito à pessoa que estamos apaixonados. É imprescindível manter uma distancia. É obrigatório manter uma zona de mim própria que permaneça minha. É urgente defender uma solidão que não pode ser destruída. Senão é asfixia.

Rui. O seu riso era a cascata que enchia a alma dela de gratidão por ser ele e ela e mais ninguém encobertos na cidade maravilhosa correndo todos os perigos.

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